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Encontro da ‘Escola de Pais’ dá diretrizes para proteger os filhos de situações de assédio e violência

Texto: Miriam Gimenes

“É importante conversarmos com eles, desde muito pequenos, que ninguém pode colocar a mão no corpo deles, principalmente nas partes íntimas. Deve-se deixar claro as pessoas que podem dar banho e também mostrar que elas precisam contar caso aconteça algo neste sentido. Se a gente não conversar sobre estas questões do corpo, geralmente cria-se um tabu em relação a isso”

A partir do momento que uma criança chega ao mundo ela está suscetível a tudo de bom e ruim que nele existe. Cabe aos pais e educadores acompanhar os pequenos e adolescentes para que os perigos, como o assédio e violência, por exemplo, não os atinjam de modo algum. E, se por uma infelicidade, algo aconteça, deve-se saber como lidar da melhor maneira possível, para que as consequências e traumas não perdurem no futuro.
Este foi o tema do último encontro da Escola de Pais, promovido pelo Colégio Xingu, no dia 13 de maio. Nele, a psicóloga Talita Bueno, do Gepem (Grupo de Estudos de Pesquisa em Educação Moral), que trabalhou em serviços que atendem menores vítimas de violência, falou sobre os riscos que meninos e meninas podem estar expostos, principalmente no ambiente virtual, e os aspectos importantes a serem observados para que os adultos possam protegê-los e orientá-los.
Para exemplificar com casos recentes, a psicóloga citou a morte do garoto Henry, 5 anos, que teria sido espancado pelo padrasto, e também o Gael, 3 anos, morto pela mãe da mesma maneira, de São Paulo. “São situações que acontecem sempre, por isso essa luta é tão importante. Principalmente sobre esta questão de educar, para que não seja por meio de violência física. Isso precisa ser muito conversado”, alerta a profissional.
Ela aponta que até a última pesquisa realizada pelo Datasus (Departamento de informática do Sistema Único de Saúde), em 2017, de 307.367 casos de violência no País, 126.230 foram em crianças e adolescentes. Já em relação à violência sexual, em 2018, houve 32.780 denúncias no Disque 100. Do total, 85,5% das vítimas eram meninas e 56,5% negros - e 87% dos agressores eram homens.
Estes dados não querem dizer, no entanto, que os meninos deixem de ser vítimas também. “Há uma cultura extremamente machista que quando o adolescente é iniciado sexualmente por uma mulher mais velha isso é visto como algo bom, porque é menino, ‘macho’, bom para o desenvolvimento dele. E não, isso é uma violência. Aliás, se ela for muito mais velha e o menino tiver menos que 14 anos é um crime, estupro de vulnerável. A gente precisa olhar para os nossos meninos com esse cuidado, eles precisam ser preparados para estas questões sexuais”, alerta Talita. Segundo ela, o suicídio é muito maior entre os meninos, justamente por conta dessa dificuldade que eles têm de falar dos sentimentos.
Por isso, acrescenta a profissional, é importante ter uma escuta qualificada, que determina que a criança ou adolescente tem de ser ouvida quando trouxer um relato de violência. E ela é dividida, principalmente, em quatro tipos: a violência física, a psicológica (alienação parental, exposição a violência doméstica, tráfico de drogas e bullying), a sexual e a institucional (prática que promove a revitimização, quando faz a criança passar novamente pela lembrança do que sofreu).

COMO IDENTIFICAR?

Talita explica que, principalmente em casos de violência sexual, a vítima tem a chamada síndrome do segredo. Ela demora para entender, até por inocência, que aquilo que passou é um assédio. “É importante conversarmos com eles, desde muito pequenos, que ninguém pode colocar a mão no corpo deles, principalmente nas partes íntimas. Deve-se deixar claro as pessoas que podem dar banho e também mostrar que elas precisam contar caso aconteça algo neste sentido. Se a gente não conversar sobre estas questões do corpo, geralmente cria-se um tabu em relação a isso”, alerta.
E, uma vez que a criança se abre, não se deve jamais culpá-la pelo que aconteceu. “Quando se rompe o segredo, a família inteira se desorganiza emocionalmente, principalmente se o agressor é uma pessoa próxima. E isso gera na criança e no adolescente um sentimento de culpa muito grande. Eles têm a fantasia de destruição desta união familiar e a gente tem de ter um olhar cuidadoso e de amparo.” O mesmo papel de acolhimento deve ser dado pela escola.
Este sentimento, acrescenta, está sempre presente na situação de violência. “A gente tem de tirar esta culpa deles. É preciso dizer que vamos tentar nos proteger. Quanto mais falarmos sobre isso e prepararmos os filhos para falarem também, mais a gente está ajudando nesta proteção.” As crianças e adolescentes precisam se sentir confortáveis para procurar ajuda, sempre.

DEPOIMENTO - ESCOLA DE PAIS

A também psicóloga Marcia Pierina, mãe do aluno Miguel Pó, do 3º ano, participou dos encontros da Escola de Pais. “Quando teve a proposta da Escola de Pais, eu li, mas não tinha o entendimento da abrangência que seria. Logo no primeiro encontro achei que foi muito frutífera a conversa, porque veio de encontro a uma emergência dos pais, em uma situação que a gente está muito próximo, por conta do processo de pandemia e isolamento que se estende. Foi uma conversa franca entre os pais, com uma pessoa olhando para essa conversa com o olhar atento, sensível e trazendo para a gente uma devolução de maneiras de entendimento, de como podemos melhorar a conversa com os filhos.”
Já o segundo encontro, com uma proposta de discussão mais específica, ajuda a lidar, diz Marcia, com os tabus e a tratá-los, da melhor maneira, com os filhos. “Falar da violência com a criança, jovem e adolescente é muito importante porque isso pode acontecer em ambientes escolares, próximo à escola, em diversos lugares. E poder ter essa troca de conhecimento, ser mais efetivo neste olhar, nesta conduta com as crianças é muito importante”. O próximo encontro será realizado no dia 17 de junho, às 18h30, pelo Microsoft Teams.

O QUE DEVE LIGAR O SINAL DE ALERTA?

Sinais físicos de violência sexual:

• Traumatismos, baixo controle do esfíncter (segurar xixi ou coco), constipação ou incontinência fecal.

• Traumatismo físico ou lesões corporais por uso de violência física.

• Comportamentos: mudanças repentinas de comportamento incompreensíveis, regressão de comportamentos infantis sem causa aparente; medo ou mesmo pânico de determinada pessoa; baixa autoestima e preocupação em agradar os outros; tristeza ou depressão crônica; vergonha excessiva; culpa; ansiedade generalizada; estabilidade aumentada; dificuldade de concentração; comportamento autodestrutivo; automutilação; falas suicidas; comportamentos agressivos, principalmente em relação a uma pessoa específica.

• Comportamentos relacionados à sexualidade: curiosidade sexual excessiva, interesse ou conhecimento súbito por questões sexuais; expressão de afeto sexualizada; desenvolvimento de brincadeiras sexuais persistentes com amigos, animais e brinquedos; relato de avanços sexuais por parentes, representações e desenhos de órgãos genitais e toque e manipulação constante de órgãos genitais.

• Hábitos de cuidado / higiene: abandono, ainda que temporário, de comportamento infantil, para que as pessoas não se aproximem; mudança de hábito alimentar; padrão de sono perturbado por pesadelos frequentes; aparência descuidada.

• Frequência e desempenho escolar: assiduidade e pontualidade exagerada; queda injustificada da frequência na escola; dificuldade de concentração e aprendizagem; ausência ou pouca participação nas atividades escolares, aparecimento de objetos pessoais além de suas possibilidades.

• Relacionamento social: dificuldade de confiar nas pessoas; relacionamentos com ares de segredo; o isolamento social; evitamento de contato físico ou contato exagerado; fugas de casa; automutilação e outros comportamentos autodestrutivos.

• Conduta dos pais e responsáveis: as famílias incestuosas tendem a ser quietas e a se relacionar com poucas pessoas; os pais são autoritários, extremamente ciumentos, e as mães submissas (geralmente porque são vítimas de violência).

Fonte: Guia Escolar - Rede de Proteção à Infância